quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Um contador de histórias...

O nome dele era Seu Jorge, um senhor já com seus 65 anos, engraçado, que gostava de contar histórias para crianças. Morava com a sua mulher, dona Dajuda, senhora simpática e carinhosa, que sempre acompanhava o marido nas tardes e noites com a criançada. Um casal maravilhoso.
Desde pequena o chamava de Meu Jorge, já que ouvia todos dizerem antes do seu nome a palavra "seu", em questão de respeito. E a chamava de tia Judinha. Todos os dias, quando a noite chegava, eu ia para a sua casa junto com as outras crianças do bairro, para ouvir as hilárias histórias do meu Jorge ao som da viola, que o Mariano, seu sobrinho tocava.
Brincava de pião com os meninos e sempre era o nosso juiz nas brincadeiras de pega-pega, queimada, nas corridas de carrinhos de rolimã e também no futebol dos meninos, que contava com a torcida das fofinhas, assim éramos chamadas por eles. E a tia Judinha fazia bonecas de pano para as meninas, no final ela sempre nos servia seus quitutes: biscoitos de nata, bolos de cenoura, sucos de caju e acerola.
O mais engraçado das histórias do meu Jorge eram seus erros de potuguês, devido não ter ido a escola quando criança. Algumas histórias ele pegava de contadores de rimas sertanejos como uma que ele contou de autoria de Raimundo Paraibano que tinha alguns erros que eu já ri muito:
Todu sertaneijo apela
Pra ver rio de inchenti
Ou tirar leiti di vaca
Pra cumer com cruzcruz quenti
Iscutar som di viola
Batendu parmas pra genti.
Ah meu Jorge... Que saudade...
No dia em que ele se foi, a tristeza foi total e abundante!
Naquele triste dia, minha mãe me informou que eu não poderia ir a casa dele naquela noite. Minha pergunta era de indignação querendo saber o motivo. No mesmo instante, bateram em minha porta. Era o Mariano, me avisando que seu tio tinha falecido. Meu desespero foi total. Não suportei vê-lo chorando e dizendo que o meu Jorge, não iria mais contar histórias. Que eu não ia mais ouvir suas gargalhadas das nossas palhaçadas. Não acreditei.
No seu enterro, todas as crianças fizeram uma homenagem, algumas nem conseguiam falar. Não suportamos ver aquela cena. Tia Judinha, chorava muito, tinha que ficar sentada, bebendo líquido toda hora para não passar mal.
Dias se passaram, tia Judinha recebia visitas nossas todos os dias, para não se sentir solitária. Sentíamos muitas saudades. Ela morou naquela casa até o dia em que se foi.
Hoje, sentimos saudades do casal que ficou na nossa memória.
Saudades de suas histórias, das criançadas, das brincadeiras, das bonecas, petiscos.
Hoje em dia, as crianças perdem tempo jogando vídeo-game, mexendo em celulares, computadores, mp qualquer coisa e etc. Não se brinca mais de pular corda, de pega-pega, raramente as crianças fazem isso.
Até que... Esses dias, a minha filha chegou com um folheto de um concurso chamado: Tempos de Escola, era para entrevistar uma pessoa, que contasse a história dela com um professor. Meu Jorge, não era professor, mas me ensinou grandes coisas. Dei uma idéia para a diretora, para que em uma tarde, os pais dos alunos fosse contar histórias da sua infância, que as crianças fizessem desenhos e etc.
Não é que aconteceu? Claro que participei, contando "Um contador de histórias...". Foi uma tarde tão gostosa. Pude até rever uma amiga minha que conviveu comigo nessa época.
É meu Jorge, hoje você não conta histórias, mas as faz.
Saudades véinho...

Bárbara Schwartz Vitório